ANCESTRALIZANDO A (SOCIO) BIOECONOMIA E O “GRITO DO TERRITÓRIO”.
TEXTO PARA EXPOSIÇÃO ORAL DEBATIDO NO DIA 28 DE SETEMBRO DE 2023.
POR ALANNA SOUTO CARDOSO (ARU/ TUPINAMBÁ)
ANCESTRALIZANDO A (SOCIO) BIOECONOMIA E O "GRITO DO TERRITÓRIO".
O que pretendo trazer para vocês hoje é o entendimento da movimentação da sócio Bioeconomia fora do gargalo e da gaiola da conceituações iniciais do desenvolvimentismo do termo enquanto apropriação das redes de sustentabilidades das biotecnologias que acabam muitas vezes por afastar o próprio entendimento original, originário e locais das economias comunitárias.
As mão-de –obras qualificadas da gaiola das biotecnologias econômicas que colocam para pensarem por nós, pelos produtores de conhecimento e culturas diversas, desde as manifestações artísticas tradicionais ao fazer agrícola, caça e pesca. E verticalizando as relações, seja com os técnicos no comando, de cima para baixo, com os agentes comunitários os colocando num mercado desleal enquanto cooptados e não parceiros captadores de suas produções, seja pela apropriação das próprias empresas tomando os lócus de produção, apropriando-se do território, e seus meios de produção.
Quando falamos de (sócio)Bioeconomia e Território não estamos fechando o processo de produção comunitário apenas no âmbito das cadeias produtivas em terras demarcadas ou tituladas, reconhecidas pelo Estado Nacional, desse ponto de vista deixaria grande parte das comunidades indígenas, ribeirinhas, quilombolas e outras formas de comunidades tradicionais, seja na cidade ou no campo de fora do entendimento de configuração territorial da abrangência e organização ampla do seus próprios produtores locais.
Nessa direção a sociobioeconomia que vamos apresentar aqui está, de acordo, com o processo histórico em que o Grito do Território está articulado, como bem pensando por Milton Santos (2005) em seu ensaio "O retorno do território" , enquanto lugares contíguos (CONTATO, CONVÍVIOS, VIZINHOS...) que retomam o movimento do seu passado a fim de redirecionar seus patrimônios comunitários a partir do início de sua História ainda nada seja como antes em contraponto dos lugares de redes (espaço de alguns/ verticalizadas) . Todavia, tratam-se dos mesmos lugares, os mesmos pontos, mas contendo objetivos e funcionalidades distintos, muitas vezes divergentes ou opostas.
E toda esse fazer simultâneo que na atualidade se faz possível, graças a força técnico-científica não mais somente controlada pela classe dominante e hegemonicamente branca, mas também por técnicos, cientistas, educadores com pertencimentos familiares próprios de seus lugares de origem, ou seja, de suas comunidades, demarcados por suas etnicidades e racialidades. Sendo assim abre-se um leque de novas formas de solidariedades, em que pese toda vasta diversidade, entre as pessoas e os lugares.
E nesse sentido cabe a nós cientistas/educadores comunitários junto com os produtores locais estarmos intervindo nas três formas que se dar na realidade desse "acontecer solidário" no Território atual que muito bem aponta e nos alerta o mestre Milton Santos (2005): um acontecer homólogo (produção agrícola ou urbana; controle das informações locais que se modernizam ainda que sob controle dos grupos locais) , acontecer complementar ( relações entre cidades; cidade-campo; intercâmbios geográficos/ consequências das necessidades modernas de produção) e um acontecer hierárquico ( Obedece um comando da organização das racionalidades do fazer produtivo , obriga-nos a pensar na produção desse comando, dessa direção na contribuição nas vidas coletivas humanas e no espaço).
O que devemos ter cuidado e fazer importante observação na ordem desse acontecer hierárquico que geralmente vem de fora e pode aparentar solidariedade, mas hierarquicamente subalterniza a produção e seus produtores, e os deixa refém de uma forma de pensar hierárquica.
O quão difícil fazer uma geo política do conhecimento em que os poderes econômicos subjugam o próprio pensar econômico comunitário. Sempre vindo do Outro. De forças centrífugas. Como bem diz a Chola Aymara Silvia Rivera Cusicanqui (2021), no lugar de uma "geo política de conhecimento" que tal reivindicarmos, o que já estamos fazendo, devemos construir "uma economia política do conhecimento", assim evita-se cair na cova de uma "geo politica de conhecimento de cunho anticolonial" , mas que não se leva , de fato, a prática , "(...) e que antes se contradiz por meio de gestos de recolonização dos imaginários e das mentes da intelectualidade do Sul" ( Cusicanqui, p.105) . Casos de assédio moral á intelectuais indígenas fora da orientação da fábula racial institucional em pseudo ordem de solidariedade de educação ambiental, por exemplo. Ou ainda o monopólio de orientação da produção dos sujeitos subalternizados, que passam a ser "sujeitos rejeitados" quando fora da "nova" ordem dessas relações de poder de " 1º mundo" que prediz inclusão, mas de fato ainda falam do Topo para baixo. De ensino e pesquisa, ignorando, assediando e/ou abusando os cientistas e técnicos/ produtores comunitários que já fazem seus próprios projetos e buscam ações formativas mais coletivas/ horizontais para movimentar suas produções, politizando o processo de captação de recursos de suas "carteiras patrimônios".
De todo modo, o que precisamos mesmo, nós enquanto produtores do conhecimento comunitário, pois a Bioeconomia é, também, fazer científico comunitário é sair da Gaiola da grande estrutura no sentido de repensar nossas estratégias de financiamentos próprios por meio das nossas organizações e gestões culturais próprias no movimento de uma sóciobioeconomia de povos que vivem historicamente e milenarmente de suas culturas comunitárias. E buscar mecanismos materiais, como bem nos alerta Cusicanqui (2021), que possam operar por trás desses discursos de saberes dentro de uma ordem oficial que tende a nos sujeitar ou nos rejeitar quando autônomos e nos fazermos pensadores de nossas próprias cabeças em nosso corpo político-jurídico organizado.
Não obstante o "controle distante" por meio das ordens transnacionais que atinge parte da parcela política da produção que é feito por cidades mundiais em seus releases nos territórios diversos que tem como consequência gravíssima a ocorrência do processo de alienação dos espaços e dos sujeitos coletivos em que o componente da mobilidade atual ou mesmo dos seus passados diaspóricos dessas famílias tradicionais desses povos os fazem perder ou mudar seus lugares de significados. Portanto lembra Milton Santos (2005): (...) o direito local e o direito internacional estão se transformando, para reconhecer naqueles que não nasceram num lugar o direito de também intervir na vida política desse lugar "(Santos, 2005, p.258).
Dessa forma os projetos comunitários em redes horizontalizadas de lugares contíguos do Instituto de Pesquisa do Projeto Cartografando Saberes está na direção da produção de conhecimento comunitário que incide no movimento da sóciobiodiversidade ou da chamada (sócio)bioeconomia dos lugares e comunidades tradicionais mobilizadas nessa associação em que atualmente estou presidindo. E os nossos atuais projetos ocorrem nessas três formas que visam um acontecer solidário nos territórios em que pese a produção comunitária e as regiões com os processos distintos de ocupação de suas terras tradicionais.
1º Temos os seguintes projetos aprovados , seja no âmbito da ordem hierárquica da Universidade do Estado do Pará que incide nas solidariedades do fazer científico no ensino e pesquisa, e abre espaço para sociedade civil organizada está atuando enquanto agente investigador-produtivo, o projeto do Estágio Pós doctor : A 'nova' Cartografia Histórica dos Engenhos e a "Presencialidade" do passado nas comunidades tradicionais da Amazônia- Demarcando políticas públicas, a educação patrimonial comunitária e a Historia oral do Instituto de Pesquisa Projeto Cartografando Saberes (IPPCS) . E que se articula com um curso de extensão Cartografia Histórica dos conflitos que mobiliza educadores comunitários e ativistas diversos em produção de conhecimento coletiva no âmbito do Patrimonio Histórico-cultural com as comunidades das chamadas Antigas Terras de Engenhos.
É importante reforçar que houve um diálogo em articulação com a PROEX Quilombola/ UEPA que incentiva e mobiliza os educadores e pesquisadores quilombolas nessa outra percepção de mapeamento coletivo enquanto ferramenta para uma educação popular patrimonial. Aliás, esse edital PROEX QUILOMBOLA ele alcança exatamente o Grito do Território do nosso mestre Milton Santos quando a Universidade permite que a sociedade civil com cientistas/ educadores quilombolas em parcerias coletivas entre na direção acadêmica dos seus processos de conhecimentos comunitários enquanto território de todos os cientistas comunitários.
Os nossos projetos ligam-se, também, com eixos norteadores do Plano de (sócio)Bioeconomia do Estado do Pará elaborado em 2022 sob coordenação da SEMAS (Secretaria do Estado do Meio Ambiente) que fez o esforço da elaboração do plano em mobilização e articulação com algumas organizações dos povos da Amazônia, as entidades indígenas, quilombolas e extrativistas, como a FEPIPA, MALUNGO e a CNS (Conselho Nacional das Populações extrativistas).
Tal Plano Estadual de Bioeconomia (SEMAS-2022) delimitar uma série de instrumentos e mecanismos econômico-financeiros que merece destaque por buscar de tornar factível a implementação das ações destacadas nos eixos de: 1) pesquisa, desenvolvimento e inovação, 2) patrimônio cultural e patrimônio genético e 3) cadeias produtivas e negócios sustentáveis. Aliás, tal plano tem sigo referenciado pelo governo federal enquanto parâmetro para mobilização do Plano Nacional da sócio bioecomomia.
Nessa direção um outro projeto importante que diz ao movimento horizontal da produção do conhecimento comunitária no âmbito da educação comunitária, os fazedores de culturas e o mapeio do Patrimonio Histórico cultural é o projeto que aprovamos pela LEI SEMEAR : Mapas da Produção do Instituto de Pesquisa do Projeto Cartografando Saberes/ Selo nossas vozes. Trata-se da mobilização de educadores e acadêmicos comunitários com pertencimentos em seus coletivos e territórios diversos, tanto na urbes quanto nas ilhas da Região Metropolitana de Belém; bem como temos planos de trabalho com comunidades indígenas, ribeirinhas e quilombolas desde a antiga Mairi perpassando o Marajo, Baixo Tapajós e o Baixo Amazonas.
Em nossos mapas de planejamentos pode ser observados os territórios indígenas, quilombolas , ribeirinhos e os povos das ilhas dessa região. No Marajó com destaque para resex Mapuá , povos de Afuá e unidade de conservação , além de quilombolas de Pontas de Pedras e Cachoeira do Arary.
E assim enquanto presidente dessa associação de educadores/ pesquisadores(as) comunitários pensamos em estratégias de captação recursos de uma carta de 400 mil para realizar o Projeto Mapas de produção nessas diversas localidades cujo objetivo geral é realizar ações formativas .
REFERENCIAS :
SANTOS, Milton. O retorno do Território. O SAL 255. [AÑO VI Nº 16 JANEIRO-ABRIL 2005].
CARDOSO, ALANNA S. A produção comunitária do IPPCS e o Novo mapeamento do passado. ANAIS DO SINGAT. https://www.institutocartografandosaberes.com/artigos/
CUSICANQUI, Silvia Rivera. Ch'ixinakax utxiwa: Uma reflexão sobre práticas e discursos descolonizadores. N-1 Edições. São Paulo. 2021.
PLANO ESTADUAL DE BIOECONOMIA DO PARÁ. PlanBio Pará. Secretário de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade – SEMAS. 2022. Disponível in: https://www.semas.pa.gov.br/wp-content/uploads/2023/01/Plano-Estadual-V9_pg-simple-2-1.pdf